Faz um tempão que eu estou ensaiando voltar a escrever aqui. E nunca venho.
No começo do ano eu fiz uma viagem épica ao Japão. Foi uma das minhas melhores experiências de viagem e um dia quero vir aqui contar um pouco. Hoje vou ficar com essa pequena “travessura”.
Conversando com minha aluna que está indo pro Japão essa semana e, enquanto ela me contava que estava em dúvida, se levava uma capa de chuva ou não, eu a tranquilizei dizendo: “não se preocupe, se chover, você pega um guarda chuva lá.” Veio aquela frase célebre “como assim???” e, completou dizendo que as melhores histórias não foram traduzidas pro inglês nas mídias sociais e nem contadas pessoalmente. Ainda.
Quando mostrei essa foto, ela me confidenciou que quando assistiu os stories do Instagram, ficou apaixonada por ele e estava torcendo pra que eu o trouxesse de lá.
A história começou num dia chuvoso em Kyoto. Um dia de chuva daqueles bem chatos, de céu cinza, chuva gelada que deixa o corpo molhado e o espírito ranzinza. A previsão era de chuva o dia todo. Não ia dar pra ficar de molho no hotel o tempo todo e meu pensamento era apenas aproveitar Kyoto o máximo possível, já que era uma oportunidade única e estava dormindo em ienes, né?
Saí animadíssima com meu boné, minha sombrinha e muito pique. Dias chuvosos pedem mais paradas em cafés, livrarias, lugares cobertos… mas uma hora o carisma de qualquer pessoa acaba. Especialmente quando você percebe que sua sombrinha deixa uma parte do se corpo ficar molhada. E o meu carisma acabou no Nishiki Market. Todo mundo teve a mesma idéia e estava lá. Pedi um docinho pra ver se a vida ficava mais leve mas pedi o doce errado. Definitivamente eu não curto o tal do purê de feijão no meio das comidas. Pelo menos eu ainda tinha meu Vegan Matcha Latte e isso me deixou menos azeda.
Só que quando eu saí do café, ainda estava chovendo. Muito. E ainda tinha muito dia pela frente. Foi o momento em que eu olhei pro lado e vi o porta guarda chuvas. Cheio de lindos guarda chuvas de todos os tipos: transparentes, coloridos, transparente com molduras pretas, brancas, cabos de madeira, de plástico, de resina…. Tinha pelo menos uns 30 ou mais ali. Mas no café tinha somente umas 18 pessoas. Não tive dúvidas: escolhi um grande, bonito mas básico, peguei e fui embora sem olhar pra trás.
Na minha cabeça, passaram mil historias. Será que aquele guarda chuvas tinha realmente um dono ou dona que daria falta dele naquela tarde chuvosa? E na falta dele, essa pessoa faria o mesmo q eu ou sairia na chuva? Ou será q ele foi simplesmente esquecido ali, esperando que alguém o resgatasse e o trouxesse de volta ao trabalho? Ou o dono daquele café tinha comprado alguns guarda chuvas e deixava lá de cortesia para os seu clientes? Escolhi a mais poética: alguém o esqueceu ali, nao voltou pra buscar porque acreditava que aquele guarda chuva tinha uma missão a cumprir: proteger esquecidos contra a chuva.
Andei completamente protegida muitos quilômetros naquele dia chuvoso por Kyoto. Ele foi meu companheiro também dois dias depois quando deixei Kyoto rumo ao Monte Fuji. Ele me protegeu das horas de garoa e chuva que tive naquele domingo. E, numa noite de garoa em Tokyo, quando fui jantar num Champagne e Gyosa Bar.
No meu último dia em Tokyo, saí à noite a procura de um lugar gostoso pra jantar. A noite estava seca mas ele estava nas minha mãos. Antes de entrar no restaurante, o deixei na porta, junto aos outros guarda chuvas. Na saída, nos despedimos. Ali acabava nosso ciclo de vida juntos. Em algum outro dia chuvoso, ele com certeza será novamente resgatado e proverá cobertura a alguma outra turista ou local. Viajando pra um outro bairro, uma outra cidade ou talvez até outro país. Completando um ciclo de ajuda mútua a todos aqueles que necessitam de sua proteção.